domingo, 28 de janeiro de 2024

O senhor do castelo dá a vida pelos súbditos
e esses o seguem com amor

Castelo de Wijnendael, Bélgica
Castelo de Wijnendael, Bélgica
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






É difícil sintetizar como era a vida nos castelos medievais, porque ela era extremamente rica e variegada, variando muito segundo os locais.

Em cada lugar era, em verdade, inteiramente diferente. Mas há alguns traços comuns.

No castelo e nos arredores vive a pequena pátria que o espírito feudal formou em torno do barão.

Ela tem seus camponeses e artesãos, que são também seus soldados; seu tribunal, que é presidido pelo senhor; seus costumes, suas tradições de honra e de heroísmo, das quais se orgulha; uma insígnia, um lema e até um nome, que é o do próprio barão.

É um todo orgânico e único, que protege seus membros contra o mundo inimigo.

Graças ao senhor feudal que por eles vigia, os camponeses se sentem protegidos, podem arar, semear e esperar a colheita sem medo de serem surpreendidos por bandidos que os pilhem e escravizem.

Diz uma crônica do tempo que os barões, “para estarem sempre prontos, têm seus cavalos na sala onde dormem”.

Pouco a pouco, por via consuetudinária, vão se estabelecendo contratos. Em retribuição pela proteção que recebem, os camponeses e artesãos dão um tanto do que produzem, para sustentar o barão e sua família, e trabalham uns tantos dias por ano na reparação e conservação do castelo.

Os interesses de uns e outros são solidários; a prosperidade dos súditos é a do barão, que com ela se rejubila; das alegrias e do renome do barão participam os súditos.

O caráter essencial desta grande família, formada pela união íntima das famílias que a compõem, é o amor mútuo, profundo e devotado entre seus membros.

Amor filial e submisso dos súditos para com o senhor, amor paternal e protetor do senhor para com seus súditos.

Uma das belas canções de gesta da época assim descreve os sentimentos do Conde de Artois, vencido numa batalha, ao ver seus homens que jazem por terra:

Sua mesnada está lá, morta, ensangüentada.
Com sua mão direita ele a abençoa,
Sobre ela se inclina e chora
E suas lágrimas correm até a cintura.

Assim como no deserto floresce o oásis junto ao poço, também no princípio da era feudal, nos lugares onde havia homens de valor para erguer a “motte” e o castelo e se opor às arremetidas do inimigo, aí havia trabalho e progresso. Porém, onde não havia senhores fortes e obedecidos, tudo caía na anarquia.

E a França ia se enchendo desses núcleos isolados, formando uma constelação de pequenas soberanias que cresciam espontaneamente, por suas próprias forças, sem planificações de governos, mas com vitalidade e pujança que permitiam prever os esplendores da civilização cristã.

Até inimigos ferrenhos da ordem hierárquica medieval, como o soturno fundador do comunismo Karl Marx, reconhecem que nunca a vida dos operários foi melhor que na Idade Média.

De fato, como constata um comunista divulgador de Marx, (Henri Lefebvre, “Le matérialisme dialectique”, P.U.F., 1962), o senhor feudal tinha outro conceito de seu feudo. Ele não se perguntava quanto valia e qual a vantagem que podia tirar.

Castelo de Montrésor, França, interior
Castelo de Montrésor, França, interior
Olhando para suas terras, bosques, rios, prados, camponeses, aldeinhas ele pensava: estas são as terras pelas quais meus antepassados deram a vida; meu pai e eu mesmo brincamos naquele bosque quando éramos crianças; aqueles são meus camponeses e burgueses por cujos antepassados os meus deram a vida e reciprocamente; eu devo passar tudo isto inteiro e melhorado para meus filhos, e para os filhos deste povo que é minha família num sentido muito largo, porque a Providência quis unir nossa história.

Por isso quando acontecia de algum senhor feudal vender seu feudo, os sinos da igrejinha tocavam a finados. Como se alguém tivesse morrido. De tal maneira, isso era considerado uma desgraça, para os nobres e para o povo.



(Fonte: “Catolicismo”, nº 57, setembro de 1955)



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domingo, 21 de janeiro de 2024

Castelos que preparam as almas para o Céu

Castelo de Bonnétable, Loire, França
Castelo de Bonnétable, Loire, França
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
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A Europa medieval foi um mito que se realizou.

A Religião Católica transformou um continente povoado de bárbaros e romanos decadentes num seminário do Céu.

Os valores que os castelos encarnam são, no fundo, valores religiosos. Porque eles são símbolos.

O lado simbólico é muito mais importante que o lado prático e que o lado estético. É por isso que nos agradam tanto.

Símbolos do quê?

O Paraíso Celeste é um lugar material.

Nele viveram Adão e Eva antes do pecado original e nele viverão os bem-aventurados durante a eternidade.

Castelo de Wernigerode, Alemanha
Castelo de Wernigerode, Alemanha

É um lugar onde Deus instalou coisas magníficas, castas e santas, para o homem viver imerso nelas.

É um mundo feito de matéria, mas de uma matéria que fala de Deus.

E os bem-aventurados ressurretos depois do fim do mundo, passearão seus corpos ressuscitados pelo Paraíso, enquanto suas almas estarão envolvidas nos gáudios magníficos da Visão Beatífica.

I. é, da visão de Deus face a face.

Para preparar os homens para isso é necessário alimentar o espírito deles.

E isso se faz não só considerando diretamente as coisas da Religião.

Nozet, castelo na Borgonha, Franca
Castelo de Nozet, Borgonha, França
Os homens chamados ao Céu precisam se voltar para Deus também a propósito das coisas do mundo temporal.

Portanto, do mundo da matéria, porque até no Céu empíreo e no Paraíso a matéria vai existir.

Como fazer isso sem chafurdar no materialismo grosseiro que anda por ai?

Os castelos ‒ poderíamos falar da arquitetura de igrejas, da arte católica em geral ‒ nos dão um exemplo.

Um exemplo de como elevar nossa alma a Deus através de construções feitas de matéria, mas modeladas pelo espírito.

E pelo espírito católico, o qual animado pela graça divina, é um preanuncio da vida eterna.




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domingo, 14 de janeiro de 2024

Majestade régia? Desigualdade odiosa?
Não! Um juiz trabalhista julgando uma causa

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
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Dir-se-ia um rei. Assim parece indicar a touca na cabeça, o manto de arminho, o fato de ele estar sentado num trono, usando um traje azul pomposo e um homem se inclina diante dele e este também.

Entretanto, não é um rei.

O internauta sabe quem é esse aí?

É um juiz trabalhista!

Patrões e operários reuniam-se em associações profissionais para resolver seus problemas. Essas associações tinham o nome de corporações de ofício, ou guildas.

Naquela época não havia lei trabalhista como nós a conhecemos hoje: cada profissão reunida na respectiva corporação ditava as normas e regras que guiavam o trabalho deles.

Controle de qualidade
Mas não era no sistema de deputados que se reúnem numa Assembléia ou Câmara e ditam leis que ficam valendo para todo o mundo, por exemplo, para todo o Brasil.

Essas leis feitas lá longe muitas vezes são recebidas como mais uma forma de interferência do Estado na vida dos cidadãos, ou como modelos de desconhecimento da vida real e dos problemas da categoria.

O verdadeiramente determinante era o costume: quer dizer os fabricantes de móveis, ou de salsichas tinham certos costumes para trabalhar, produzir, vender, então, pronto!

Esse costume ‒ se não era imoral, quer dizer, se não ia contra a Lei de Deus e contra o Direito Natural ‒ virava lei efetiva.

O conjunto legal assim definido é conhecido como Direito Consuetudinário.

Por vezes, o costume era transcrito no papel. Outras vezes ficava na tradição oral.

Obviamente, podiam aparecer litígios. Então as corporações de ofício escolhiam seus juízes que julgavam segundo esses códigos profissionais.

Havia assim tribunais diretamente ligados à categoria para resolver as questões trabalhistas com profundo conhecimento de causa.

Métodos honestos
Sempre eleito juiz um membro da corporação. E, para julgar as questões trabalhistas ele vestia, neste lugar, nesta cidade, com esta roupa e sentava nesse trono.

Vagamente os juízes ainda conservam certas aparências nessa linha como a toga e por vezes sentam numa poltrona mais elevada.

Na iluminura a discussão versa sobre o método de trabalho empregado pelos querelantes: o juiz esta vendo eles agirem para depois emitir sentença.

O juiz presta atenção num e depois no outro. Os dois são operários também.

Veja-se com que esplendor se vestia um juiz plebeu, um juiz de profissão trabalhista, e a respeitabilidade com que ele era considerado e respeitado.

Isso é um elemento indispensável para ter garantia de uma Justiça bem feita, neste vale de lágrimas.


(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, 22/4/1973. Sem revisão do autor).



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