segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Tesouros de Natal: São Nicolau, a árvore maravilhosa, Santa Lucia e o pudding real

Natal 2020, anônimo peruano e igreja colegiata de Thann, Alsacia
Natal 2020, anônimo peruano e igreja colegiata de Thann, Alsácia
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






Natal abre clareiras de luz e alegria nas trevas e nas tristezas.

Enquanto em Belém raiava a salvação, o imperador Augusto refletia o fracasso de sua política moralizadora.

Perto dele iam noite adentro as orgias e os arúspices e falsos teólogos jogavam as sortes com o oculto.

Eles não sabiam a sociedade do futuro se decidia num estábulo da Judeia.

Ali as mãos virginais de Maria davam ao mundo o Messias que o redimiria com seu sangue, o reorganizaria com seu Evangelho e o inundaria de gáudios com sua graça.

Quem foi São Nicolau?


Foi o caso de São Nicolau (270–343) de Bari, Itália, bispo de Myra, hoje na Turquia, e cuja festa é o 6 de dezembro, no Advento.

São Nicolau joga pela janela a dote para as moças nobres pobres, Fra Angelico (1395 –1455), Pinacoteca Vaticana
São Nicolau joga pela janela a dote para as moças nobres pobres.
Fra Angelico (1395 –1455), Pinacoteca Vaticana
Um nobre arruinado de sua diocese, pai de três moças, não podia pagar a dote para casá-las e pensou dá-las ao meretrício.

Na noite o santo bispo viu as meias delas secando na lareira, e jogou pela janela uma sacolinha em cada uma com moedas que valiam a dote.

Ninguém imaginaria que essa caridade mudaria os costumes do mundo durante milênios. Do norte da Europa e da América uma torrente de cartas infantis o saúda e lhe implora presentes.

Na Alemanha, os Correios encaminham todo ano por volta de 500 mil cartas para a agência de Engelskirchen, ou Igreja do Anjo, na Renânia do Norte-Vestfália.

Uma outra agência na Finlândia, recebe mais meio milhão com saudações e pedidos.

A imaginação e a fé deram a São Nicolau uma realidade que não se limita ao Céu celestial.

A mente infantil está certa que ele vive nesta terra lendo essas cartas e faz suas listas aguardando o período natalino para distribuir os regalos.

Mas onde está ele? Por que só aparece nesse período? A tradição forjou a imagem de um piedoso ermitão que mora num local inacessível.

Qual? Pois, o Ártico! Lá, revestido de suas insígnias episcopais, agasalhado com peles, lê cada carta junto à lareira de uma cabana num bosque sepultado pelas neves.

Lá ele ajeita seu trenó e alimenta as renas que o conduzirão por todos os elementos.

Mas de onde saíram esse trenó e essas renas que nunca houve em Myra nem em Bari? Pois, da poesia de 1823 “Uma visita de São Nicolau”, de Clement Clarke Moore.

São Nicolau numa escola pública de Linéville, Alsácia.

Para a inocente alma infantil tudo ficou explicado.

As renas traziam São Nicolau de trenó! São quatro casais de renas, cada uma nomeada pelas suas qualidades.

Uma nona vai na frente de todas e é a mais famosa: Rodolfo Nariz Vermelha.

Ela tem um faro especial e seu nariz fica vermelho brilhante quando se aproxima da casa de uma criança que fez méritos. 

O comerciário Papai Noel e o verdadeiro São Nicolau

Deixemos de lado a contrafação comerciária de Papai Noel e vejamos como São Nicolau é recebido em alguns países.

Aliás, o primeiro Papai Noel que se fez ver no Brasil foi numa Ceia de Natal em São Luís do Maranhão por volta de 1890.

Entrou pela janela com a saca de presentes, mas os homens puxaram trabucos e revolveres.

Salvou a vida porque Da. Maria Barbara de Andrade, filha do poeta Joaquim de Sousa Andrade, se interpôs gritando: “Não o matem! É o Papai Noel! Eu o contratei!”.

Na Alsácia, na fronteira da França com a Alemanha. São Nicolau é um personagem oficial.

As escolas do Estado preparam os alunos lhes ensinando canções que pedem sua vinda no 6 de dezembro quando ele chega com seu cortejo e convoca cada criança a render contas e lhe dar o presente.

Atrás dele em ruas e praças vem um personagem sinistro: é o Padre Látego, encapuçado, de barba e cabelos desgrenhados, rosto escuro e olhar sombrio.

Ele faz ressoar no ar um látego, pau ou feixe de varas visando as crianças desobedientes.

São Nicolau e o 'Padre Látego' em Mulhouse, Alsácia
São Nicolau e o 'Padre Látego' em Mulhouse, Alsácia.
Numa grande saca garante levar os meninos que não fazem suas orações.

As crianças o vaiam e lhe jogam bolinhas de papel.

Jules Hoches o pintou como “um enviado do Diabo que ameaça levar as crianças que não cumprem as promessas”.

Em Wissembourg monta um cabalo negro e peludo, escoltado por ginetes apocalípticos que com o fragor de tambores aterrorizam a população.

Lutero, pai do protestantismo, detestava os santos e não queria a festa de São Nicolau.

E acabou sendo ele o Padre Látego dos maus cristãos! A Contrarreforma católica aprovou a figura para inculcar nas crianças o senso do prêmio e do castigo.

A árvore maravilhosa


Os presentes podem chegar na festa de São Nicolau, no Natal, ou ainda na Epifania, trazidos pelos Reis Magos, segundo as regiões.

O costume mais antigo é deixar meias penduradas na lareira em lembrança das três moças do início da cavalgada milenar de São Nicolau.

Árvore e meias para os presentes de São Nicolau, EUA
Árvore e meias para os presentes de São Nicolau, EUA
Na Holanda as crianças as enchem de feno para alimentar as pobres renas com a esperança que quanto maior a meia e o feno, mais grande será o presente.

Mas podem receber só um carvão se não se comportaram. Em alguns países os presentes chegam em mais de uma festa.

Sélestat, cidade da Alsácia, é uma das que reivindica a paternidade da Árvore de Natal e exibe o mais antigo documento que há sobre ele.

Mas os pinheiros ornados e com presentes ficam pendendo do teto no interior das igrejas.

Após a Missa de Epifania as crianças vão com varas derrubar os presentes.

O pai da árvore natalina tal vez seja São Bonifácio que derrubou um imponente carvalho que os bárbaros idolatravam como deus.

Depois plantou um pinheirinho que pelo seu perfil triangular servia para explicar o mistério de Deus Uno e Trino, e o ornou com frutas e sementes símbolo das graças que distribuía.

A maçã vermelha brilhante era ideal para isso, mas um aziago ano, a geada queimou a colheita.

Na Alsácia e na Turíngia mestres vidreiros substituíram as frutas e nozes com bolas cristalinas que a rainha Victória da Inglaterra (1819–1901) mandou adotar em seus castelos.

O mundo todo seguiu o exemplo.

Lucía: a Santa da Luz


Santa Lucia, seu dia na Suécia.
Nos países nórdicos, a mártir romana Santa Lucia (293–304) é especialmente comemorada no dia 13 de dezembro.

Ela é uma das oito santas invocadas no Canon da Missa católica tradicional.

Ela foi uma nobre de Siracusa, de riquíssima família e excecional beleza que consagrou sua virgindade a Deus.

Não sabemos seu nome, mas ela saía às noites a distribuir doações e alimentos aos pobres com uma lâmpada de vela que lhe dava luz e o nome Lucia.

Nas torturas para faze-la apostatar lhe arrancaram os olhos, mas Deus lhe deu outros ainda mais belos.

Por isso é a padroeira dos oftalmologistas e dos doentes dos olhos pois tira os cegos da escuridão.

Na Escandinávia os dias do Advento são curtos e escuros.

Então moças vestidas de branco com uma coroa de velas levam bolos para os pobres e carvão para os que passam frio.

Na Noruega, na Suécia, e na Finlândia coros de meninas assim coroadas processionam lembrando a Luz de Cristo que ilumina as trevas – até nos recintos protestantes! Os rapazes usam vestes alusivas a Santo Estevão protomártir.

O culto foi levado por missionários medievais e paradoxalmente renasceu no século XIX sob o tamanco luterano.

Santa Lucia com roupas tradicionais suecas.
Santa Lucia com roupas tradicionais suecas.
As procissões públicas começaram em 1927 quando um jornal de Estocolmo escolheu a Lucia do ano e o exemplo pegou fogo em cidades, escolas, jornais e TVs.

Segundo o Guinness a procissão de Santa Lucia na capital sueca é a maior do mundo com 1200 membros de escolas de música. Ela ingressa numa sessão do Parlamento entoando uma canção tradicional napolitana e vilancicos locais.

Em certas universidades, há um jantar especial em seu dia.

A Finlândia imitou a Suécia e a Santa Lucia do ano é coroada na catedral de Helsinki, paradoxalmente protestante.

A também herética Dinamarca imitou a Suécia em 1944 pelo desejo oficial “de trazer luz numa época de escuridão”.

A festa é comemorada seletivamente nas escolas.

Na noite anterior só se acendem velas e se apagam as luzes elétricas e se canta o famoso vilancico napolitano à Santa.

Na Noruega, comemora-se Lucia como aquela que espanta os espíritos, gnomos e fantasmas que giram pela terra nos dias mais negros do ano e pune aqueles que trabalham no Natal.

No Norte da Itália, Santa Lucia leva presentes às crianças nos dias 12 e 13 de dezembro quando são feitas umas bolachinhas doces com forma de olhos que lembram seu martírio.

As crianças lhe deixam um pouco de café, palha para seu burrico e um copo de vinho de Castaldo.

Na Hungria e na Croácia planta-se uma semente de trigo num vaso em sua festa e o broto no Natal é símbolo do triunfo da vida sobre a morte e do nascimento de Jesus e da Eucaristia.

Nas Filipinas celebra-se uma novena de missas antes de sua festa.

No Caribe, a Santa é a padroeira de uma pequena ilha que leva seu nome e festeja sua data como Dia Nacional.

O ‘pudding’ real inglês


A rainha e os príncipes herdeiros preparam o pudding familiar tradicional.
A rainha e os príncipes herdeiros preparam o pudding familiar tradicional.
 ‘pudding’ inglês é a fonte de todos os pudins da terra e não pode faltar nem no Palácio real de Buckingham.

Cada família faz seu ‘pudding’ com fórmula exclusiva, inclusive a família real.

Em 2019, a rainha cedeu sua função aos príncipes herdeiros.

O encarregado de fazer a mistura dos 25 elementos foi o principinho George que agiu com ferrenho entusiasmo acolitado pelos príncipes Charles e William.

A receita secreta deu 99 pequenos ‘puddings’ presenteados pela rainha para o Natal dos postos militares mais afastados.

Elizabeth II presentou também 1.500 puddings de boa loja a seus 500 auxiliares nos castelos.

Eles receberam junto um cartão assinado pela rainha e receberam um cumprimento pessoal.

O pudding de Natal da famíliia real presenteado aos soldados servindo longe do país
O pudding de Natal da famíliia real presenteado aos soldados servindo longe do país
O ‘pudding’ não é de origem inglês, mas foi trazido pelos soldados romanos que amassavam – como os tropeiros com o cuscuz – em sua alforja frutos secos, nozes, amêndoas, etc. com leite e álcool e iam comendo a massa em suas longas expedições. Assim devia ser nos tempos de Jesus em Belém.

Vinte e um séculos depois da divina Natividade, o mesmo mundo comemora o Natal sem saber de seu destino que, aliás, intui cada vez mais negro.

A Terra afundou num caos que nem nos tempos de Augusto teve igual.

Mas, como os pastores que adoraram o Menino Deus no presépio, hoje os homens de boa vontade podem procurar a salvação nas mãos da Mãe de Deus.

Só por meio dEla será restaurado o reinado social de Jesus Cristo onde haverá festas de Natal incomparavelmente mais belas de tudo o que os homens até agora conheceram.


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